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terça-feira, 18 de outubro de 2011

Flagra

"No escurinho do cinema
Chupando drops de anis
Longe de qualquer problema
Perto de um final feliz"
Rita Lee e Roberto de Carvalho

Era abril de 1976. Esperávamos ansiosamente a estreia do filme "Tubarão" em Recife, sucesso de bilheteria há um ano. Mas naquela época, o famigerado peixe já fazia sucesso entre nós, que nadávamos atrás dos arrecifes na praia de Boa Viagem. Volta e meia assustávamos uns aos outros gritando: Tubarão! E, pelo sim, pelo não, procurávamos a barbatana do bicho deslizando na água. Depois de termos certeza de que tudo era uma brincadeira, continuávamos boiando tranquilos.


Eu tinha quase quatorze anos e havia visto um lindo menino na praia jogando frescobol. Depois disso, havia descoberto que ele era amigo do meu irmão. Estava apaixonada e tudo o que queria era conhecê-lo. A oportunidade havia surgido e havíamos combinado ir assistir ao filme mais comentado do ano.

Eu me arrumara com capricho: saia jeans, blusa vermelha, cabelos longos e escovados. Perfumada, olhos brilhando e feliz da vida! Tomamos o ônibus que, por possuir ar-condicionado, era chamado de "fresquinho". Rumo ao cinema Moderno, na Praça Joaquim Nabuco. A fila estava imensa. Me lembro de termos entrado uns agarrados aos outros, com medo de se perder na multidão e pulamos por cima das poltronas para evitar sermos esmagados. Éramos seis: Paulo André, Monique, Ana Maria, meu irmão, Rui e eu.


Meu coração estava acelerado tanto pela ida ao cinema em grupo, quanto pelo filme, quanto pela companhia ao meu lado esquerdo. Compráramos pipoca, chocolate e bombons. A luz do cinema apagou, o lanterninha ainda acomodava alguns atrasados, tinha gente nas escadarias, gente que encerrava a conversa, gente feliz!

Nas primeiras cenas do filme meu coração adolescente já estava apertado. Aquele tubarão branco nadando silenciosamente, a moça mergulhando à noite, minha respiração estava entrecortada de pavor. Nem me lembrava mais do meu herói lindo, loiro, alto e jovem ao meu lado. A tensão era enorme! 


Passados alguns minutos, senti que uma mão segurava a minha e o meu coração mudava o compasso da batida. Aquela sensação era desconhecida para mim. Pela primeira vez na vida eu segurava a mão de um menino e era o meu escolhido, o mais belo, o mais perfeito dos seres humanos.


Eu prestava atenção ao filme, mas não descuidava daquele prazer. Tão jovem e, por instantes, me sentindo tão mulher, tão dona de mim. Aí o tubarão surgiu novamente, que susto, virei o rosto para não ver aquela fera de olhos aterrorizantes. E meus olhos, mesmo no escuro, encontraram os dele. Meu primeiro beijo... Quanta ternura, inocência e carinho! E um pedido: "quer namorar comigo?" Sim, sim, sim. Eu estava amando. Meu primeiro amor estava acontecendo, meu primeiro beijo, meu primeiro encantamento!


Continuei assistindo ao filme segurando a mão do meu namorado. Eu tinha um namorado, meu primeiro namorado. Eu era uma garota feliz! Saí do cinema flutuando de felicidade. Os comentários sobre o filme eram ouvidos ao longe porque, naquele dia, os sinos dobravam por mim, anunciando uma nova etapa da minha vida.


Eu tinha conhecido o meu primeiro amor.


Ouça a música: http://letras.terra.com.br/rita-lee/66794/



2 comentários:

  1. Ê nostalgia!
    Mamãe, gosto do que você escreve. Continua publicando!

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  2. Chorei. E, ao contrário do que pode parecer, porque choro muitas vezes, meu choro não é banal. Me comovi mais ainda com o comentário de Lívia. Seu texto é muito bom, porque faz o leitor visualizar as cenas e se emocionar. Continue publicando.

    Abraço carinhoso de sua comadre.

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