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segunda-feira, 26 de março de 2012

Tempo, Tempo, Tempo, Tempo - Caetano Veloso


És um senhor tão bonito
Quanto a cara do meu filho
Tempo tempo tempo tempo
Vou te fazer um pedido
Compositor de destinos
Tambor de todos os ritmos
Entro num acordo contigo
Por seres tão inventivo
E pareceres contínuo
És um dos deuses mais lindos
Que sejas ainda mais vivo
No som do meu estribilho
Ouve bem o que eu te digo
Peço-te o prazer legítimo
E o movimento preciso
Quando o tempo for propício
De modo que o meu espírito
Ganhe um brilho definitivo
E eu espalhe benefícios
O que usaremos pra isso
Fica guardado em sigilo
Apenas contigo e comigo
E quando eu tiver saído
Para fora do teu círculo
Não serei nem terás sido
Ainda assim acredito
Ser possível reunirmo-nos
Num outro nível de vínculo
Portanto peço-te aquilo
E te ofereço elogios
Nas rimas do meu estilo
Tempo tempo tempo tempo 



Cheguei à conclusão de que vendemos nosso tempo muito barato. Uma pessoa precisa trabalhar para usufruir de condições para cuidar de si, dos outros e até do planeta. Mas habitualmente, dedica mais tempo ao trabalho do que a outras atividades que gosta ou precisa fazer.

Do filme:Morangos Silvestres
Precisamos  e gostamos de ir ao dentista, ir ao médico, acompanhar os filhos, estar com os amigos, estudar, se deslocar,  cuidar do corpo, ir ao cinema, ler, cozinhar, se alimentar,  fazer compras, dormir, pensar e a lista segue infindável ... Mas dedicamos muito mais tempo ao trabalho. A maioria de nós precisa de autorização de um superior para ir ao médico. Na volta, deve apresentar atestado de comparecimento e, muitas vezes, compensar essas horas. Se para ir ao médico é um transtorno, o que pensar se formos ao salão de beleza? 

Como  realizar um bom trabalho voluntário se ele também exige responsabilidade, assiduidade e todas os demais "ade" do nosso trabalho? Quem não gostaria de acompanhar melhor a vida escolar dos filhos ou estar mais com o companheiro? E cuidar da alimentação da família e da arrumação da casa? E fazer uma atividade física com regularidade? Ou meditar? Ou não fazer nada? Quando conseguimos é quase sempre às custas de algo ou alguém. As mulheres, por exemplo, ainda pagam um preço muito alto por estar no mercado de trabalho, mesmo com ajuda do companheiro ou de outra pessoa.

Muitas famílias são "governadas" pela presença de outras mulheres e homens que deixam seus lares para cuidar de outros. São as babás, empregadas domésticas, diaristas, jardineiros, caseiros e demais profissionais dessa área que, segundo pesquisas recentes divulgadas na Revista Época  vem diminuindo gradativamente. Será que a mulher vai retornar sua vida ao lar? Será que vai diminuir a quantidade de filhos? Ou será que vai diminuir a quantidade de horas trabalhadas e, naturalmente, se conformar com rendimentos mais baixos ainda do que os que recebe atualmente?
Estou citando as mulheres porque sou mulher, mas as pessoas vendem seu tempo por um preço muito baixo. Considerações a parte sobre uma minoria que exerce cargos mais altos penso aqui naqueles e naquelas que saem todos os dias de casa deixando para trás filhos, atividades e até sonhos, mesmo! Acho que se essas pessoas não querem e não podem sair do mercado de trabalho, precisam exigir rendimentos mais robustos, que a façam abrir mão de tudo o que citei por um valor justo. Mas o que é um valor justo? Será que existe? Até mesmo para essa minoria que citei?

A dupla jornada de trabalho feminina ainda é fato, mesmo que muitos homens já participem da vida doméstica. Mas levará tempo até que a divisão de tarefas se torne igual.Porque não se trata somente de divisão de trabalho, mas sim, de felicidade. Quando uma mulher sai para trabalhar, ela troca muitas vezes,  felicidade por pouco dinheiro. Mesmo sendo feliz com o seu trabalho, ela faz malabarismos para administrar o tempo.

Será que devemos promover um movimento em prol de salários mais dignos da perda de felicidade que juntamos ao longo da vida? Esse fenômeno da inserção da mulher no mercado de trabalho é complexo porque a ela ainda é cobrado papéis considerados estritamente femininos como exercer a maternidade, administrar o lar e ainda mirar-se no exemplo das Mulheres de Atenas: "... quando amadas se perfumam, se banham com leite, se arrumam Suas melenas..."

Para que trabalhemos o suficiente e desfrutemos do ócio não devemos apenas fazer aquelas  mudanças sugeridas em seminários, revistas e livros:  ter mais flexibilidade nos horários pessoais, reorganizar o horário, investir na qualidade do tempo dedicado à família, etc. Acho que é a sociedade quem precisa de uma reorganização do tempo de trabalho. As empresas devem oferecer condições para as pessoas trabalharem à distância;  os horários de trabalho também poderiam ser melhor distribuídos, quando isso fosse possível. Por que a maioria trabalha das 9h às 18h? O trânsito fica caótico com tantos veículos circulando! Por que precisamos trabalhar todos os dias nos mesmos horários? Não seria interessante termos horários variados ao longo da semana? 

Defendo que o valor do horário de trabalho seja rediscutido em outros termos que não somente o financeiro. Então, quem tiver a oportunidade de negociá-lo, que o faça bem feito. 

A reflexão fica. Que as pessoas mudem o que for possível, que discordem, que concordem, mas não sejam apáticas. Insisto: nosso tempo é precioso!





9 comentários:

  1. Profundo.....lindo...sua cara.... revolucionário....simples...
    Adorei simples assim...

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  2. Ainda bem que você gostou, Lane. Fiquei meio confusa ao escrever esse texto. Tantas ideias misturadas...
    Beijos

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  3. Não dá para publicar o comentário do Serginho:
    Cara Fátima,

    O tempo é, na mitologia grega, Cronos, portanto um Deus, por conseguinte autônomo.
    E aí está o grande imbróglio: o ser humano na sua vontade de ser Deus quer também se assenhorar do tempo - claro que isso não é possível.
    Acredito que só poderemos ter uma relação mais harmônica com Cronos, ou o tempo, quando não tivermos que focá-lo na relação trabalho-capital-consumo.
    A propósito da otimização/racionalização do tempo, tem um livro do Bertrand Russel - O Elogio do Lazer - que trata da redução da jornada de trabalho para que as pessoas tenham mais tempo para si e para os seus, além, claro, de aumentar a produtividade e gerar mais empregos (argh!...).

    Beijos,

    Serginho

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  4. Serginho, li "O ócio criativo" do Domenico De Masi. É instigante o ponto de vista apresentado por ele. Vou ler esse do qo qual você falou; não conheço.

    Bom ler o que você escreve, me estimula.

    Beijos, querido!

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  5. Tâamra e Sarah Queridas, obrigada pelos comentários enviados por e-mail. Não publiquei aqui porque são muitas a sperguntas que vocês fazem e preferi responder pelo GMail.

    A todos que frequentam o blog, atualizo: estou bem. Voltei a trabalhar e sigo segurando a mão de Deus. Aos poucos me sinto mais forte, mais segura!

    Beijos

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  6. Será que todo mundo "perde felicidade" enquanto trabalha? E se o trabalho for uma das coisas que a pessoa gosta de fazer e lhe traz felicidade?

    E se todo mundo for ao médico na hora que bem entende, como fica a organização dos que dependem do nosso trabalho?

    Abraços e muita sáude,

    Ceci

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  7. Não, Ceci, não perdem felicidade. Acho que poderiam ser mais felizes se pudessem fazer do trabalho algo a mais em suas vidas, e não a razão principal.

    Com certeza, as pessoas não iriam ao médico na hora em que bem entendessem, e se os horários fosse flexibilizados, seria mais fácil e menos estressante. Pessoas que trabalham são responsáveis e precisam do salário para viver. Com certeza saberiam usar com parcimônia esse benefício.

    Beijos

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  8. Comentário da minha cunhadainha querida:]
    "Adorei, tentei comentar no apartirdaletra mas não consegui.


    Arnaldo Jabor que se cuide!... Sua crônica está profunda, lógica e incorrigível!...

    Resposta: CULPA DO $I$TEMA!..."

    Viviane

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  9. Vivi Querida,

    Ah se o Jabor ler isso... rs rs rs
    Obrigada pelos elogios! Generosos demais!
    Beijos,

    Fátima

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